Deixei?
Permiti?
Não deixei
Me permiti
Permiti todo o que chamara de ridículo
Expus-me quase na manchete
Falei de tudo que não devia
De todo o tudo que escondera

Privei-me
Privei-me de comportamento
Mas ardia
Ardi
Ardo
E continuarei ardendo

Privei-me de perguntas, pois já fora rechaçada ao perguntar
Privei-me de vontades, pois estávamos aprendendo a desviciar
Privei-me de álcool por solidariedade
Privei-me de erva por recomendação acatada
Privei-me de senso
Privei-me do que prometera

Privei-me
Mas ardia
Ardi
Ardo
E continuarei ardendo

Dediquei-me na elegia
Me expus
Me expus como prometera não fazer
Através da poesia
Mas se dediquei
Se expus
Foi por não privar-me
Pois ardia
Ardi
Ardo
E continuarei ardendo

Entreguei com cautela
Entreguei nada além de pedaços
Pois estava aos pedaços
Estava nos cacos
Estava me remendando
Estava me reunindo

Mas entreguei
Como um carteiro
Entreguei e estava aprendendo a entregar
Aprendendo a pisar
Aprendendo o tamanho de teus mocassins
Aprendendo que estava sensível
Meus cacos me cortam
Mas ia aprendendo a não cortar
Querendo entregar os cacos mais bonitos
o todo estava aprendendo
ou melhor, reaprendendo
Pois tudo que não conseguira não ser
Era ardor
Pois ardia
Ardi
Ardo
E continuarei ardendo

Fui com medo
Com muito medo
Não vacila
Eu gritava
Não vacila
Eu pedia
Não vacila
Não conseguirei não me cortar nos cacos
Se vacilar

Mas vacilei
Sem saber o quê
Rejeitando os comos
Procurando os porquês
Eu vacilara

Não vacilaria de novo, é bem verdade
Mas de que adianta?
O que modifica?
Passam o Linha II Shopping e o Centro:
A imagem não vai sair da cabeça.
Fomos fadadas às paradas de ônibus
No começo e no fim
Mas que fim?
Quem estipula o fim?
Você?
Eu?
A parada?

É sempre a intensidade
É sempre o conjunto de nossas milhares
É sempre o fluxo
E eu só sei arder
Pois ardia
Ardi
Ardo
E continuarei ardendo.

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